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Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos

O Projeto Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos, coordenado pelo Instituto O Direito por um Planeta Verde tem como meta fomentar o desenvolvimento de instrumentos regulatórios relacionados às mudanças climáticas nos países: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, integrantes do Tratado de Cooperação Amazônica. LEIA MAIS

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01/07/2010

Não ao substitutivo do Código Florestal


Em defesa do meio ambiente brasileiro e da produção de alimentos saudáveis, um grupo de intelectuais, artistas, organizações sociais e demais entidades, entre as quais o INSTITUTO O DIREITO POR UM PLANETA VERDE, lançaram um MANIFESTO, exigindo a total rejeição do Projeto de Lei de autoria do deputado Aldo Rebelo.

Assim como toda lei setorial existente no Brasil, a legislação florestal também precisa ser atualizada paulatinamente, considerando as mudanças socioeconômicas regionais. Contudo, “neste momento, mais importante que reformar o Código Florestal é fortalecer sua aplicação”, defende Carlos Teodoro José Hugueney Irigaray, Presidente do Instituto o Direito por um Planeta Verde.

Na opinião de Teodoro Irigaray, o Brasil vive um período tenso em que as discussões no Congresso Nacional relacionadas à reforma do Código Florestal, visam a “desconstruir as bases da proteção legal do meio ambiente em nosso país”. Para o Presidente, “os ataques orquestrados ocorrem tanto na esfera estadual, como federal”. “Fazendo da reforma do Código Florestal uma bandeira irresponsável para aqueles que simplesmente desejam fomentar a expansão do desmatamento, sobretudo na Amazônia e no cerrado brasileiro”, afirma.

Para o Procurador do Estado de São Paulo, Diretor do Instituto O Direito por um Planeta Verde, Guilherme José Purvin de Figueiredo, transferir para os Estados federados a regulamentação das áreas que hoje são protegidos pelo Código Florestal significa abrir espaço para uma nova modalidade de “guerra fiscal”. A competição entre os Estados baseada na permissividade ambiental. “Aquele que tiver um sistema mais frouxo de proteção ambiental atrairá para si os degradadores”.

Em entrevista ao Observatório Eco, ele é categórico ao listar os vários motivos pelos quais é contra às mudanças no Código Florestal que estão em discussão no Congresso Nacional. “O que temos visto são propostas de flexibilização de uma legislação que vem sendo desrespeitada há muito tempo pelos mesmos setores que apostam em sua revogação”, argumenta.

De outra parte, o relatório de desmatamento produzido no âmbito do Projeto Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos, identifica as áreas de preservação permanente (APPs), a reserva legal, a servidão florestal, a cota de reserva florestal e a reposição florestal como medidas mitigadoras e/ou de adaptação aos efeitos das mudanças climáticas, sendo que todos estes instrumentos estão previstos no Código Florestal. A adaptação aos efeitos das mudanças climáticas consiste nas iniciativas capazes de reduzir a vulnerabilidade de sistemas naturais e da sociedade aos efeitos reais ou esperados das mudanças climáticas e precisa ser considerada quando se fala em mudar o Código Florestal. Já a mitigação é a intervenção antropogênica destinada a reduzir as fontes de emissão de gases de efeito estufa ou ampliar sumidouros destes gases. O Brasil vem sendo assolado por desastres decorrentes de cheias, sendo a mais recente nos Estados de Alagoas e Pernambuco. As APPs, mesmo que não tenham sido planejadas para isso na sua origem, hoje são típicos instrumentos de adaptação aos efeitos da mudança do clima. Isto porque, um dos efeitos do aquecimento global são as fortes intempéries, tais como as que estamos vivenciando, que ocasionam inundações e deslizamentos de terra. A reserva legal, a servidão florestal e a reposição florestal, por sua vez, são medidas mitigadoras aos efeitos do aquecimento global, pois, mesmo não tendo sido criadas para esta finalidade, geram o que se chama “carbono fixado”, já que a vegetação armazena o CO2 no corpo da planta, não permitindo que este gás atue na forma de efeito estufa. Em um momento em que visivelmente se agravam os desastres e que notadamente os locais mais vulneráveis são aqueles nos quais a legislação já aponta que não é possível construir por ser APP (topo de morro, encosta, beira de rio) é irresponsável alterar legislação. Suprimir regras gerais de proteção da vida e dos ecossitemas que valem para todo o território é , no mínimo, ignorar os efeitos do aquecimento global, não obstante os inúmeros estudos que apontam a necessidade de atuação imediata. Além disso, considerando os compromissos de redução de emissões de gases de efeito estufa assumidos pelo Governo Brasileiro e levando em conta que 75% das emissões nacionais de CO2 advem do desmatamento, qualquer alteração do Código Florestal destinada a permitir o incremento do desmatamento é totalmente contraditória à política nacional de mudanças climáticas.


Confira a íntegra do Manifesto:

No dia 9 de junho de 2010, o Dep. Federal Aldo Rebelo (PCdoB/SP) apresentou o seu relatório à Comissão Especial, criada na Câmara dos Deputados, para analisar o Projeto de Lei n.º 1876/99 e outras propostas de mudanças no Código Florestal e na Legislação Ambiental brasileira. O referido relatório, de mais de 250 páginas, apresenta a proposta de substituição do Código Florestal (Lei n.º 4.771, de 15 de setembro de 1965).

Apesar de ser de 1965, o Código Florestal é bastante atual, pois está baseado em uma série de princípios que respondem às principais preocupações em torno do uso sustentável do meio ambiente.

Nesse sentido, as entidades populares, agrárias e ambientalistas, reconhecendo a necessidade de atualizar as leis, sempre defenderam o aperfeiçoamento do Código Florestal, especialmente para adequá-lo à realidade da agricultura familiar e camponesa. Há a concreta necessidade de se criar regulamentações que possibilitem ao Código atender às especificidades da agricultura familiar. Além disto, é essencial uma série de políticas públicas de fomento, crédito, assistência técnica, agroindustrialização e comercialização, as quais garantirão o uso sustentável das áreas de reserva legal e proteção permanente.

Estas mudanças, no entanto, são muito distintas das propostas no Projeto de Lei (PL). Isso porque, segundo cálculos de algumas entidades da área ambiental, a aplicação do mesmo resultará na emissão entre 25 bilhões a 30 bilhões de toneladas de gás carbônico só na Amazônia. Isso representa em torno de seis vezes a redução estimada de emissões por desmatamento que o Brasil estabeleceu como meta. Consequentemente, esta emissão impediria o país de cumprir esta meta assumida na conferência do clima de Copenhague.

Podemos afirmar que todo o texto do Projeto de Lei é insatisfatório, privilegiando exclusivamente os desejos das forças mais arcaicas do Brasil: os latifundiários. Dentre os principais pontos crítico do PL, podemos citar: anistia completa aos desmatadores; a abolição da Reserva Legal para agricultura familiar; a possibilidade de compensação desta Reserva fora da região ou da bacia hidrográfica; e a transferência do arbítrio ambiental para os Estados e Municípios.

Primeiro, de acordo com o substitutivo, a responsabilidade de regulamentação ambiental passará para os estados. É fundamental entendermos que os biomas e rios não estão restritos aos limites de um ou dois Estados, portanto, não é possível pensar em leis estaduais distintas capazes de garantir a preservação dos mesmos. Por outro lado, esta estadualização representa, na prática, uma flexibilização da legislação, pois segundo o próprio texto, há a possibilidade de redução das áreas de Preservação Permanentes em até a metade se o estado assim o entender.

Em segundo lugar, o Projeto acaba por anistiar todos os produtores rurais que cometeram crimes ambientais até 22 de julho de 2008. Os desmatadores que descumpriram o Código Florestal terão cinco (5) anos para se ajustar à nova legislação, sendo que os mesmos não poderão ser multados neste período de moratória e ficam também cancelados embargos e termos de compromisso assinados por produtores rurais por derrubadas ilegais. A recuperação dessas áreas deverá ser feita no longínquo prazo de 30 anos!

Em terceiro lugar, o Projeto desobriga a manutenção de Reserva Legal para propriedades até quatro (4) módulos fiscais, as quais representam em torno de 90% dos imóveis rurais no Brasil. Essa isenção significa, por exemplo, que imóveis de até 400 hectares podem ser totalmente desmatados na Amazônia – já que cada módulo fiscal tem 100 hectares na região –, o que poderá representar o desmatamento de aproximadamente 85 milhões de hectares. É fundamental entendermos que a Constituição Federal estabeleceu a Reserva Legal a partir do princípio de que florestas, o meio ambiente e o patrimônio genético são interesses difusos, pertencente ao mesmo tempo a todos e a cada cidadão brasileiro indistintamente. E é fundamental ter claro que nenhum movimento social do campo apresentou como proposta essa abolição da RL, sempre discutindo sobre a redução de seu tamanho (percentagem da área total, principalmente na Amazônia) ou sobre formas sustentáveis de exploração e sistemas simplificados de autorização para essa atividade.

Ainda sobre a Reserva Legal, o texto estabelece que, nos casos em que a mesma deve ser mantida, a compensação poderá ser feita fora da região ou bacia hidrográfica. Além disso, esta recomposição poderá ser feita por meio do plantio de espécies exóticas. Isso significa que a supressão de vegetação nativa pode ser compensada, por exemplo, por monoculturas de eucaliptos, pinus, ou qualquer outra espécie, descaracterizando o bioma e empobrecendo a biodiversidade.

O Projeto de Lei traz ainda uma conseqüência nefasta, ou seja, a anistia dos desmatadores ou a isenção em respeitar o mínimo florestal por propriedade, destrói a possibilidade de desapropriação daquelas propriedades que não cumprem a sua função ambiental ou sócio-ambiental, conforme preceitua a Constituição Federal em seu art. 186, II.

Em um momento onde toda a humanidade está consciente da crise ambiental planetária e lutando por mudanças concretas na postura dos países, onde o próprio Brasil assume uma posição de defesa das questões ecológicas nacionais e globais, é totalmente inadmissível que retrocedamos em uma legislação tão importante como o Código Florestal. É inaceitável que uma legislação de 1965 seja mais moderna, ética e preocupada com o futuro da sociedade brasileira do que uma proposta de 2010.

A proposta do deputado Aldo Rebelo atenta violentamente contra a sua história de engajamento e dedicação às questões da sociedade brasileira. Ao defender um falso nacionalismo, o senhor deputado entrega as florestas brasileiras aos grandes latifundiários e à expansão desenfreada do agronegócio. Ao buscar combater supostas influencias de ONGs internacionais, se esquece que na realidade que é internacional é o agronegócio brasileiro, subordinado ao capital financeiro estrangeiro e às transnacionais do setor agropecurário e agroquímico. A sua postura em defesa do agronegócio o coloca imediatamente contrário à agricultura camponesa e familiar, a qual diz defender.


Por isso, nós, intelectuais, artistas e organizações sociais abaixo-assinadas, exigimos a total rejeição do Projeto de Lei de autoria do deputado Aldo Rebelo.


VIA CAMPESINA
MST – MOVIMENTO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS SEM TERRA
MPA – MOVIMENTO DOS PEQUENOS AGRICULTORES
MMC – MOVIMENTO DAS MULHERES CAMPONESAS
FETRAF – FEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES NA AGRICULTURA FAMILIAR
CIMI – CENTRO INDIGENÍSTA MISSIONÁRIO
CPT – COMISSÃO PASTORAL DA TERRA
CNASI – CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE ASSOCIAÇÕES DOS SERVIDORES DO INCRA
IDPV – INSTITUTO O DIREITO POR UM PLANETA VERDE


Fonte: Adriana Vargas/ Redação Planeta Verde


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